Valor inclui R$ 1,6 bilhão em reajustes tributários em análise na Câmara. Sem isso, custeio e investimento serão cortados; ‘não é déficit’, diz gestor.
O governo do Distrito Federal enviou à Câmara Legislativa uma proposta de orçamento de R$ 32,6 bilhões para o próximo ano. O montante é 5,84% maior do que o de 2015, fixado em R$ 30,8 bilhões. O documento prevê o mesmo valor para receitas e despesas, embora inclua R$ 1,6 bilhão de arrecadação que depende da aprovação do pacote anticrise enviado pelo governador Rodrigo Rollemberg à Câmara em setembro.
O secretário-adjunto de Planejamento, Orçamento e Gestão, Renato Brown, afirma que a inclusão dessas receitas condicionadas não é uma maquiagem nas projeções para 2016. “Orçamento deficitário é quando eu digo que vou aumentar meu endividamento por conta de uma despesa. Aqui, a gente não está emitindo título, criando dívida. É diferente do orçamento da União”, afirma. O orçamento enviado pelo governo federal ao Congresso em setembro indicou déficit de R$ 30,5 bilhões.
Segundo Brown, o valor extra está vinculado a gastos discricionários, que podem ser cancelados durante a tramitação do orçamento. “Onde a gente colocou R$ 1,6 bilhão? Boa parte está em investimentos de educação e saúde, mais ou menos R$ 600 milhões. O resto é custeio, gastos com limpeza, manutenção, fornecedores”, diz o secretário.
Como boa parte desses contratos já está assinada com prazo de até cinco anos, o governo deve recorrer a um dispositivo da Lei de Licitações que permite reduzir a prestação de serviços e o pagamento em até 25% em “decorrência do interesse público”. Contratos novos devem ser firmados pelo sistema de registro de preços, na tentativa de reduzir o valor destinado às empresas.
Limites legais
Brown diz que o eventual cancelamento dos investimentos em saúde e educação não gera risco de descumprimento da Constituição Federal. Ela prevê que R$ 1 em cada R$ 4 de impostos deve ir para a manutenção do ensino, e 13,4% para a Saúde. “Felizmente ou infelizmente, nossos salários são tão altos que, só com o pagamento da folha, a gente quase atende o mínimo constitucional”, diz.
O quadro é mais complicado no respeito aos gastos com pessoal. O GDF estourou o limite máximo previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e tem até maio para normalizar a situação, sob pena de ter repasses e empréstimos barrados. Se o orçamento total diminui, a folha de pagamento passa a representar uma porcentagem cada vez maior.
“Esses investimentos [em saúde e educação] são importantes porque alavancam muito dinheiro. Se eu boto R$ 100 milhões, consigo captar até R$ 4 bilhões em repasses, contrapartidas e empréstimos. São recursos importantes para a expansão do próprio serviço público”, diz o secretário.
Sem a aprovação dos reajustes de impostos na Câmara, o gestor diz que há risco real de o GDF “se encrencar” para respeitar a legislação federal. “A estrutura da LRF, neste ponto, é muito dura, te dá dois quadrimestres para voltar [aos limites] Ela dobra os prazos caso o crescimento econômico seja inferior a 1%, mas esse também é um cenário péssimo para o governo.”
Receita e despesa
No total, o custeio da máquina pública deve consumir R$ 7,48 bilhões em 2016. O valor inclui despesas com vigilância, limpeza, material de escritório e contas de consumo de hospitais, delegacias, escolas e prédios do GDF. O gasto com pessoal deve atingir R$ 20 bilhões, e o investimento previsto é de R$ 2,9 bilhões.
No lado das despesas, o orçamento também prevê R$ 1,1 bilhão para reservas de contingência, R$ 400 milhões em inversões financeiras e R$ 700 milhões entre pagamentos de juros e amortizações da dívida pública.
No campo das receitas, o GDF prevê arrecadar R$ 15 bilhões em impostos e taxas e R$ 1,27 bilhão em multas e juros de contribuintes inadimplentes. Juntos, os valores têm acréscimo de 5,3% em relação a 2015 por causa do pacote de reajustes em tramitação na Câmara. O governo também contabiliza R$ 2,9 bilhões em receitas de capital e R$ 1,8 bilhão em receita intraorçamentária – quando a despesa de um órgão é fonte de receita para outro.
O Fundo Constitucional do DF, repassado mensalmente pela União ao GDF para pagar parte salários e investimentos em saúde e educação, é estimado em R$ 4,9 bilhões – a parte destinada à segurança pública é gerenciada pelo Tesouro Nacional e entra no Orçamento Geral da União. No total, a União deve injetar R$ 12,3 bilhões, R$ 382 milhões a menos que 2015, por causa da retração econômica do país.
Mais impostos
A proposta orçamentária foi apresentada à Câmara em 15 de setembro, junto com os projetos de lei que aumentam a arrecadação. Até esta sexta (2), parte das propostas já tinha sido aprovada, reduzindo a necessidade de cortes no orçamento.
No dia 29, os deputados aprovaram a alta no ICMS de bebidas alcoólicas e tabacaria, de 27% para 31%. Também foram aprovadas a regulamentação da cobrança de ICMS nas compras feitas pela internet ou pelo telefone e a autorização para que o GDF cobre a “diferença de imposto” de fornecedores instalados em estados com alíquota mais baixa.
Somadas, as três medidas podem gerar impacto positivo de R$ 597 milhões, segundo cálculos do GDF descritos na proposta orçamentária (veja abaixo). Assim, faltaria ainda R$ 1,03 bilhão para equalizar o orçamento de 2016.
Até esta sexta (2), as propostas de reajuste no valor venal dos imóveis, nas alíquotas gerais do IPTU e do ICMS, nas taxas de limpeza (TLP) e iluminação (CIP) públicas e no ICMS de TV a cabo ainda estavam barradas na Câmara. Se forem aprovadas até o fim do ano, já não podem valer a partir de 1º de janeiro por causa da “noventena”.
Combate à crise
Em janeiro, o GDF disse ter identificado um rombo de R$ 6,5 bilhões nas contas públicas da capital. O montante incluía R$ 15 milhões negativos no caixa herdados de 2014, R$ 3 bilhões de despesas conhecidas da gestão anterior e outros R$ 3,5 bilhões de salários subestimados no orçamento para 2015.
Em nove meses, o Executivo enviou à Câmara uma série de projetos de lei para aumentar impostos e, com isso, aumentar a arrecadação. A maioria das sugestões enfrentou rejeição dos deputados. Parte foi retirada de tramitação pelo GDF e parte aguarda votação na Casa.
Entre fevereiro e maio, o GDF teve de desistir de cinco projetos que reajustavam tributos e um que reduzia o número de administrações regionais, por não haver acordo para aprová-los na Câmara. Os temas voltaram à pauta no segundo semestre, com o agravamento das infrações à LRF.
Em 15 de setembro, Rollemberg anunciou um pacote de combate à crise e incluiu medidas que não precisavam tramitar no Legslativo. As tarifas de ônibus e de metrô subiram para até R$ 4, a entrada do Zoológico de Brasília passou de R$ 2 para R$ 10 e as refeições nos restaurantes comunitários, de R$ 1 para R$ 3.
Governador, vice e secretários tiveram corte de 20% nos salários. O reajuste de servidores que foi negociado pelo ex-governador Agnelo Queiroz e passaria a valer em setembro foi suspenso, pelo menos, até 2016, assim como concursos públicos que eram esperados para este ano.
Outros reajustes
Em fevereiro, a Câmara aprovou aumentos de impostos que começam a valer em 2016. O IPVA para automóveis sobe de 3% para 3,5%, e para motocicletas, de 2% para 2,5%, e acaba a isenção do mesmo imposto no ano da compra.
O ICMS pago na gasolina e em serviços de telefonia sobe de 25% para 28%, e no diesel, de 12% para 15%. O Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) passa de 2% para 3% do valor venal, para venda de imóveis acima de R$ 250 mil.
Somadas, essas mudanças representam R$ 500 milhões adicionais de receita para 2016 – montante que não faz parte do R$ 1,6 bilhão pendente porque já era conhecido quando o orçamento foi elaborado.
Fonte: G1