Embaixada acompanha investigação de ataque a brasileiro em Berlim

Após ter sido atacado por alemães em Berlim, um artista circense do Rio Grande do Sul está internado em um hospital da Alemanha, com o rosto desconfigurado, desde o último domingo. Vítima de xenofobia, Rafael Lucas Gonçalves foi espancado e quebrou o maxilar, o nariz e alguns ossos da bochecha. “Pikapau”, como é conhecido no circo, precisou colocar uma placa de titânio na face, em uma cirurgia realizada na quarta-feira. A expectativa é de que a vítima receba alta amanhã. A polícia local prendeu um dos suspeitos e, segundo o ministro Roberto Avelar, da embaixada do Brasil na capital alemã, os investigadores estão tomando todas as providências para punir os responsáveis pelo crime de ódio.

O artista havia sido contratado pela produção de um festival cultural de arte de rua, sediado na capital alemã, para fazer apresentações circenses por 20 dias. No evento, ele e mais alguns colegas de profissão divulgavam e democratizavam as apresentações pelas ruas da cidade. No último dia do festival, para celebrar o bom momento e o encerramento dos espetáculos, Rafael e mais cinco amigos foram conhecer melhor a região. Fizeram uma pequena caminhada da Alexanderplatz, uma das praças mais conhecidas de Berlim, até o centro, por volta das 22h.
De acordo com uma das pessoas que estava no momento dos ataques, mas que preferiu não ser identificada com medo de retaliações, o grupo — de dois brasileiros, dois argentinos e dois chilenos — começou a ser seguido por cinco alemães que estavam visivelmente alterados. “Eles já vinham atirando latas de cerveja, falando alto e agindo grosseiramente. Quando cruzaram por nós, falaram alguma coisa em alemão. Não entendemos, então alguns dos meninos os questionaram. Foi então que partiram para cima”, conta uma artista integrante do grupo. O maior deles, segundo ela, foi agredir Pikapau, com socos no rosto, que acabou desmaiando. Mas o ataque não terminou. “Mesmo no chão, eles continuaram batendo nele, chutando o rosto dele”, acrescentou.
A testemunha contou que, quando o grupo percebeu que o colega estava desmaiado, tentaram fugir dos alemães, carregando-o. No entanto, foram perseguidos por mais alguns quarteirões. “Saiam do nosso bairro! Não voltem aqui”, diziam, em inglês. Quando já estavam seguros, chamaram uma ambulância para socorrer Rafael. Os médicos e enfermeiros fizeram o reconhecimento e acionaram a polícia: “Eles identificaram os suspeitos. Um deles até tentou fugir, mas foi pego depois. Passaram um dia na delegacia e logo depois foram liberados”.
Para buscar apoio jurídico, a artista foi à embaixada do Brasil na terça-feira. Pediram que retornasse no dia seguinte para falar com a responsável pelo setor jurídico. No entanto, ela voltaria para Brasília e não poderia estar lá presencialmente. “Foram superintransponíveis. Mesmo assim, deixei contato do Rafa e dos amigos que ainda estão na cidade, expliquei toda a história, mas nenhum contato foi feito”, afirmou.
O ministro Roberto Avelar relatou, contudo, que a Embaixada do Brasil só tomou conhecimento dos ataques xenófobos ontem por meio do bilhete deixado na porta do órgão pela artista. Entretanto, não conseguiu contato com nenhum dos colegas de Rafael e nem foi procurada por ninguém depois do ocorrido.
No texto deixado na representação diplomática, havia o contato da produtora do grupo na Europa, a alemã Stefanie Rossa, que “foi contactada imediatamente pelo Departamento Jurídico”. Segundo Avelar, a embaixada “está mantendo contato direto com a polícia alemã para saber os desdobramentos do caso”. O ministro disse ainda que não há detalhes sobre o estado de saúde de Rafael porque, pela legislação alemã, as informações só podem ser repassadas com autorização do paciente.
Xenofobia
“Tenho certeza de que o que passamos em Berlim foi xenofobia. Não que fosse uma justificativa, mas sequer estávamos vestidos com nossas roupas artísticas. São fascistas que não gostam do novo, do diferente”, lamentou a artista. Ela ressalta a importância do debate sobre esses episódios de intolerância e ódio que ainda perduram no mundo. “Foi com a gente, mas poderia ter sido com qualquer um. Foi desesperador.”
Além do desgaste físico e emocional, Rafael ainda precisa arcar com os custos do hospital e com as despesas do dia a dia. O artista, que mora em Cabo Verde, ficará na cidade alemã por, ao menos, mais um mês. Ele vai precisar ficar de repouso por três meses e até seis meses sem fazer acrobacias. Como o artista depende do corpo para trabalhar, os colegas da arte fizeram um evento beneficente cuja renda total arrecadada foi doada para ele. O grupo pretende ainda se mobilizar e criar uma vaquinha virtual para que o Pikapau tenha uma preocupação a menos durante a recuperação.
Fonte: Correio Braziliense

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