Micro-organismo foi identificado em mulher; 15 pacientes foram isolados.
Medida visa segurança; não há risco de contágio em outra área, diz diretora.
Duas alas do pronto-socorro do Hospital Regional de Taguatinga, no Distrito Federal, foram interditadas nesta quinta-feira (28) após a identificação de uma superbactéria multirresistente em uma mulher de 79 anos internada no local. Com a interdição, 15 pacientes que estavam nas alas vermelha e amarela da emergência (para quadros mais graves) estão isolados e fazendo exames para identificar uma possível contaminação. Segundo a diretora de Saúde de Taguatinga, Eliene Ancelmo Berg, não há risco de contaminação em outras áreas do hospital.
Também estão suspensos os atendimentos de emergência nas áreas de clínica médica, ortopedia, cardiologia e cirurgia. A medida ocorre porque os pacientes graves não teriam onde ficar. A Secretaria de Saúde orienta que aqueles que necessitem desse tipo de atendimento procurem outras unidades da rede, até que as áreas sejam reabertas.
Segundo Eliene, o risco de contágio foi agravado pela superlotação na emergência no hospital. O pronto-socorro do HRT tem capacidade de 54 leitos, mas abrigava 168 pacientes na tarde desta quinta. A sobrecarga atinge as alas de menor gravidade, identificadas com as cores verde e azul, onde o risco de contágio foi descartado e os pacientes que receberem alta serão liberados normalmente.
Bactéria ‘comum’
Segundo a médica infectologista do HRT, Heloísa Ravagnani, o contágio é causado por uma “versão mais resistente” do enterococo, uma bactéria presente naturalmente no trato intestinal das pessoas. Para ela, a resistência extra foi causada pelo histórico de tratamentos e deficiência imunológica da paciente atingida.
“Com o uso de antibióticos e o histórico de doenças que atacam a imunidade, essas bactérias acabam sendo selecionadas. A doença se manifestou em uma mulher idosa, com doenças crônicas, cardiopata e diabética. Não é uma coisa de outro mundo, é uma bactéria de amplo conhecimento médico”, diz. Heloísa afirma que o micro-organismo não tem qualquer relação com a superbactéria KPC na origem, no contágio ou no tratamento.
Segundo a especialista, o enterococo não se propaga pelo ar, mas pelo contato físico entre uma pessoa doente e uma saudável. Como os profissionais de saúde envolvidos no tratamento da paciente usavam luvas, máscaras, capote e avental, nenhum deles precisou ser isolado.
A variação de enterococo encontrada na idosa é resistente a três classes de antibióticos, mas é tratada com um quarto tipo de medicamento. Segundo a infectologista, esse tratamento deve durar 14 dias, mas novos exames serão feitos no período.
A paciente infectada estava se recuperando de uma pneumonia, mas o quadro regrediu. Por causa da nova bactéria, ela apresentou febre e piora no quadro respiratório. Segundo a equipe do HRT, o estado de saúde da idosa é “muito grave”.
“Esse tipo de contaminação pode levar a insuficiência renal, a insuficiência respiratória, assim como todas que atingem o trato respiratório ou que caem na corrente sanguínea, como foi o caso”, diz Heloísa. A mulher contaminada pela bactéria não tem previsão de alta.
Resistência
“Superbactéria” é um termo que vale não só para um organismo, mas para bactérias que desenvolvem resistência a grande parte dos antibióticos. Enzimas passam a ser produzidas pelas bactérias devido a mutações genéticas ao longo do tempo, que tornam grupos de bactérias comuns como a Klebsiella e a Escherichia, resistentes a muitos medicamentos.
Outro mecanismo para desenvolvimento de superbactérias é a transmissão por plasmídeos – fragmentos do DNA que podem ser passados de bactéria a bactéria, mesmo entre espécies diferentes. Uma Klebsiella pode passar a uma Pseudomonas, e esta pode passar a uma terceira. Se o gene estiver incorporado no plasmídeo, ele pode passar de uma bactéria a outra sem a necessidade de reprodução.
No território nacional circulam outras bactérias multirresistentes, como a SPM-1 (São Paulo metalo-beta-lactamase). Entre os remédios ineficazes estão as carbapenemas, uma das principais opções no combate aos organismos unicelulares. Remédios como as polimixinas e tigeciclinas ainda são eficientes contra esses organismos, mas são usados somente em casos de emergência, como infecções hospitalares.
KPC
Em outubro do ano passado, a Secretaria de Saúde isolou a UTI neonatal do Hospital Materno Infantil depois que exames feitos em três bebês apontaram a presença da superbactéria KPC. De acordo com a pasta, o diagnóstico não significava que eles desenvolveriam infecção, mas a medida havia sido adotada para evitar uma eventual propagação do micro-organismo.
Em 2010, casos notificados de pessoas infectadas pela KPC levaram a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a instituir normas de combate à bactéria. Entre as medidas anunciadas estava a instalação de dispensadores de álcool em gel em todos os ambientes de atendimento nos hospitais e clínicas públicas e particulares.
Em 2009, de 1º de janeiro até o dia 15 de outubro, 18 pacientes morreram por conta da KPC no DF. No mesmo período, foram registradas 183 pessoas portadoras da bactéria, das quais 46 tiveram infecção. A Secretaria de Saúde não informou o número total de casos desde então.
A KPC já foi identificada em Minas Gerais, São Paulo, Distrito Federal, Goiás e Santa Catarina. Ela faz parte da flora intestinal das pessoas e pode ser transmitida por meio do contato. As complicações costumam ocorrer somente em casos de pacientes com baixa imunidade, como os que estão com câncer em estágio avançado ou passaram por transplantes.
Fonte: G1