Liminar suspende tramitação de projeto que dificulta criação de partidos

gilmar mendesO ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes suspendeu, em liminar concedida na noite desta quarta-feira (24/04), a tramitação do projeto de lei que dificulta a criação de partidos. Na decisão, o ministro estabelece que a proposta fique paralisada no Congresso até o julgamento do mérito do mandado de segurança protocolado na terça pelo senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Minutos antes, o Senado rejeitou um requerimento para que a matéria tramitasse com urgência.

Gilmar Mendes destaca que houve uma “aparente tentativa casuística de alterar as regras para criação de partidos na corrente legislatura, em prejuízo de minorias políticas e, por conseguinte, da própria democracia”.

Um dos alvos do projeto seira barrar a criação do partido da ex-senadora Marina Silva, que pretende se candidatar ao Palácio do Planalto em 2014. A proposta veta a transferência para novas legendas do fundo partidário e do tempo de TV do partido de origem quando a mudança ocorrer no meio do mandato.

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Segundo Gilmar Mendes, a liminar não tem como objetivo impedir “a livre conformação legislativa”, mas busca aguardar um posicionamento definitivo do Supremo. “O que se pretende resguardar é a manifestação do Pleno do Tribunal acerca de sua fiel interpretação da Constituição e o tratamento isonômico, em uma mesma legislatura, de todos os atores e partidos políticos interessados, sob pena de violação aos princípios democrático, do pluripartidarismo e da liberdade de criação de legendas”, destaca a decisão do ministro.

Ao entrar com o mandado de segurança, Rollemberg alegou que o projeto de lei é “visivelmente abusivo, casuístico, ilegal e inconstitucional”. “O STF entendeu que a simples apreciação da proposta inconstitucional geraria um constrangimento muito grande. Preservamos a democracia e a igualdade de direitos dos parlamentares”, afirmou o senador nesta noite, depois de receber a notícia de que a limimar havia sido concedida.

Fonte: Correio Braziliense

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3 COMENTÁRIOS

  1. 03/05/2013
    Por: Virgílio Afonso da Silva (Professor Titular de Direito Constitucional da USP)

    Na semana passada, todos os holofotes estavam apontados para a Câmara dos Deputados, que discutia uma proposta de emenda constitucional (PEC) que, segundo muitos, é flagrantemente inconstitucional, por ferir a separação de poderes. Contudo, a decisão mais inquietante, em vários sentidos, inclusive em relação à própria separação de poderes, estava sendo tomada no prédio ao lado, no Supremo Tribunal Federal (STF).

    No dia seguinte, nas primeiras páginas dos jornais, o grande vilão, como sempre, foi o poder Legislativo. A PEC analisada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara é polêmica, com certeza. Sua constitucionalidade é questionável, não há dúvidas. Mas, do ponto de vista jurídico, da separação de poderes e do direito comparado, a decisão do STF, que bloqueou o debate no Senado sobre as novas regras de acesso dos partidos políticos à TV e ao fundo partidário, é muito mais chocante.

    O ponto mais polêmico da PEC é a exigência de que uma decisão do STF que declare a inconstitucionalidade de uma emenda constitucional seja analisada pelo Congresso Nacional, o qual, se a ela se opuser, deverá enviar o caso a consulta popular.
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    Ministro decidiu que o Senado não poderia deliberar sobre um projeto de lei porque ele não concorda com o teor
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    É quase um consenso entre juristas que um tribunal constitucional ou uma suprema corte, como é o caso do STF, deve ter a última palavra na interpretação da constituição e na análise da compatibilidade das leis ordinárias com a constituição. Mas muito menos consensual é a extensão desse raciocínio para o caso das emendas constitucionais. Nos EUA, por exemplo, emendas à constituição não são controladas pelo Judiciário. A ideia é simples: se a própria constituição é alterada, não cabe à Suprema Corte analisar se o novo texto é compatível com o texto antigo. Isso quem decide é povo, por meio de seus representantes.

    Mesmo no caso do controle de leis ordinárias, há exemplos que relativizam o “quase consenso” mencionado acima, como é o caso do Canadá, cujo Parlamento não apenas pode anular uma decisão contrária da Suprema Corte, como também imunizar uma lei por determinado período de tempo contra novas decisões do Judiciário.

    Não há dúvidas de que o caso brasileiro é diferente. A constituição brasileira possui normas que não podem ser alteradas nem mesmo por emendas constitucionais, as chamadas cláusulas pétreas. Mas não me parece que seja necessário entrar nesse complexo debate de direito constitucional, já que o intuito não é defender a decisão da CCJ, cuja conveniência e oportunidade são discutíveis.

    Neste momento em que o Legislativo passa por uma séria crise de legitimidade, não parece ser a hora de tentar recuperá-la da forma como se tentou. Tampouco quero defender a constitucionalidade da PEC no seu todo. O que pretendi até aqui foi apenas apontar que, embora extremamente polêmica, a proposta é menos singular do que muitos pretenderam fazer crer.

    Já a decisão do ministro Gilmar Mendes, tomada na mesma data e que mereceu muito menos atenção da imprensa, é algo que parece não ter paralelo na história do STF e na experiência internacional. Ao bloquear o debate sobre as novas regras partidárias, Gilmar Mendes simplesmente decidiu que o Senado não poderia deliberar sobre um projeto de lei porque ele, Gilmar Mendes, não concorda com o teor do projeto.

    Em termos muito simples, foi isso o que aconteceu. Embora em sua decisão ele procure mostrar que o STF tem o dever de zelar pelo “devido processo legislativo”, sua decisão não tem nada a ver com essa questão. Os precedentes do STF e as obras de autores brasileiros e estrangeiros que o ministro cita não têm relação com o que ele de fato decidiu. Sua decisão foi, na verdade, sobre a questão de fundo, não sobre o procedimento. Gilmar Mendes não conseguiu apontar absolutamente nenhum problema procedimental, nenhum desrespeito ao processo legislativo por parte do Senado. O máximo que ele conseguiu foi afirmar que o processo teria sido muito rápido e aparentemente casuístico. Mas, desde que respeitadas as regras do processo legislativo, o quão rápido um projeto é analisado é uma questão política, não jurídica. Não cabe ao STF ditar o ritmo do processo legislativo.

    Sua decisão apoia-se em uma única e singela ideia, que pode ser resumida pelo argumento “se o projeto for aprovado, ele será inconstitucional pelas razões a, b e c”. Ora, não existe no Brasil, e em quase nenhum lugar do mundo, controle prévio de constitucionalidade feito pelo Judiciário. Mesmo nos lugares onde há esse controle prévio – como na França – ele jamais ocorre dessa forma. Na França, o Conselho Constitucional pode analisar a constitucionalidade de uma lei antes de ela entrar em vigor, mas nunca impedir o próprio debate. Uma decisão nesse sentido, de impedir o próprio debate, é simplesmente autoritária e sem paralelos na história do STF e de tribunais semelhantes em países democráticos.
    Assim, ao contrário do que se noticiou na imprensa, a decisão do STF não é uma ingerência “em escala incomparavelmente menor” do que a decisão da CCJ. É justamente o oposto. Além das razões que já mencionei antes, a decisão do STF é mais alarmante também porque produz efeitos concretos e imediatos, ao contrário da decisão da CCJ, que é apenas um passo inicial de um longo processo de debates que pode, eventualmente, não terminar em nada. E também porque, se não for revista, abre caminho para que o STF possa bloquear qualquer debate no Legislativo sempre que não gostar do que está sendo discutido. E a comprovação de que essa não é uma mera suposição veio mais rápido do que se imaginava: dois dias depois, em outra decisão sem precedentes, o ministro Dias Toffoli exigiu da Câmara dos Deputados explicações acerca do que estava sendo discutido na CCJ, como se a Câmara devesse alguma satisfação nesse sentido. É no mínimo irônico que, na mesma semana em que acusa a Câmara de desrespeitar a separação de poderes, o STF tenha tomado duas decisões que afrontaram esse princípio de forma tão inequívoca. A declaração de Carlos Velloso, um ex-ministro do STF que prima pela cautela e cordialidade, não poderia ter sido mais ilustrativa da gravidade da decisão do ministro Gilmar Mendes: “No meu tempo de Supremo, eu nunca vi nada igual”!

    Virgílio Afonso da Silva é professor titular de direito constitucional na Faculdade de Direito da USP.

  2. Rcl 4979 / DF – DISTRITO FEDERAL
    RECLAMAÇÃO
    Relator(a): Min. GILMAR MENDES
    Julgamento: 15/04/2007
    Publicação DJ 23/04/2007 PP-00028
    Partes
    RECLTE.(S): PARTIDO RENOVADOR TRABALHISTA BRASILEIRO – PRTB
    ADV.(A/S): RICARDO CELSO BERRINGER FAVERY
    RECLDO.(A/S): PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
    RECLDO.(A/S): PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL
    Decisão
    DECISÃO:

    Trata-se de reclamação, com pedido liminar, ajuizada pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB contra atos praticados pelo Presidente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na tramitação do Projeto de Lei nº 84/07 (Câmara dos Deputados) e da Proposta de Emenda Constitucional nº 02/07 (Senado Federal), sob o argumento de que tais atos ferem a autoridade da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal nas ADIs 1.351 e 1.354, afrontando o Poder Judiciário e colocando em risco o Estado Democrático de Direito.

    Eis os argumentos do Reclamante:
    “Com isso ferem a autonomia e independência dos Poderes, in casu o Poder Judiciário, pois já decidiu a questão a que pretendem seja, com uma nova roupagem, novamente discutida e, assim, ferir a autonomia dos Poderes e causar irreparáveis prejuízos aos direitos das minorias, in casu, os ditos pequenos partidos e ferir de morte a preservação da competência e a garantia das decisões desse Colendo Tribunal.” (fl. 08)
    Pede-se, ao final, a suspensão liminar do curso do Projeto de Lei nº 84/2007 e da Proposta de Emenda Constitucional nº 02/2007, em face da iminência de votação dos referidos projetos e possível aprovação nas respectivas Casas Legislativas.
    Passo a decidir.

    Preliminarmente, verifico a impossibilidade de conhecimento da pretensão do Reclamante. Não obstante seja indiscutível o cabimento de reclamação para assegurar o cumprimento de decisão tomada em sede de controle abstrato de constitucionalidade pelo STF (Rcl 1880/QO/AgRg, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 19.03.2004), não há possibilidade jurídica do pedido, no caso, pela tese da vinculação do legislador federal às decisões do STF.

    Como já tive oportunidade de suscitar em debates anteriores (vide meu voto na ADI 2.797/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ 19.12.2006), entendo que a edição de lei é, sim, uma forma de interpretar a Constituição e não há nenhuma ofensa, desaforo, ato injurioso para esta Corte quando o Legislativo Federal edita uma lei, eventualmente, de teor idêntico. No caso, não é supremacia parlamentar federal, é supremacia da Constituição, tanto é que cabe depois o controle efetivo – basta ver, nesse ponto, o modelo alemão.
    Conforme tenho defendido em sede doutrinária (cf. MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle Concentrado de Constitucionalidade. Comentários à Lei n. 9.868,de 10.11.1999.São Paulo: Saraiva, 2001, pp. 312-325.), não raro justificou-se a renúncia à declaração de nulidade em virtude de uma intolerável intervenção no poder ou na liberdade de conformação do legislador (POHLE, Albrecht Peter. Die Verfassungswidrigerklärung von Gesetzen, p. 78 e s; MOENCH, Christoph. Verfassungswidriges Gesetz und Normenkontrolle, p. 47).

    Portanto, não se pode duvidar que a tarefa de interpretar a Constituição Federal seja inafastável desse papel do próprio legislador. Isso é uma coisa óbvia, quer dizer, elementar no âmbito da Corte Constitucional, que obviamente aplica o modelo alemão. A rigor, esse é um modelo vinculante de aplicação da Constituição e não adere a nenhuma ideia de supremacia ou soberania de parlamento. Neste caso, o legislador federal cumpre função importante no entrechoque dos Poderes de, eventualmente, superar o entendimento anterior ou provocar um novo pronunciamento da Corte via nova proposta.
    A invocação desse poder de conformação do legislador tem merecido sérias críticas na doutrina [cf., a propósito, SKOURIS, Wassilios. Teilnichtigkeit von Gesetzen, p. 52; MAURER, Hartmunt.Zur Verfassungswidrigerklärung von Gesetzen, p. 345 (357); IPSEN, Jörn. JZ 1983, p. 41 (44); SACHS, Michael. Tenorierung bei Normenkontrollentscheidungen des Bundesverfassungsgerichts. DöV 1982, p. 23 (27)]. Segundo alguns autores, a liberdade de conformação do legislador não seria afetada na maioria dos casos, uma vez que este poderia editar as novas regras exigidas tanto após uma declaração de nulidade quanto depois da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade. Acentue-se, por outro lado, que a discricionariedade do legislador não legitima a conservação parcial de norma inconstitucional, assim como a discricionariedade administrativa não obsta à cassação do ato administrativo eivado de ilegalidade (SKOURIS, Wassilios. Teilnichtigkeit von Gesetzen, cit. p. 52).
    Colocado o problema nesses termos, penso que não é possível admitir que o legislador ordinário federal tenha a sua liberdade totalmente tolhida pelas declarações de constitucionalidade ou inconstitucionalidade do Tribunal. É adequado e prudente, inclusive, que tais atos legislativos federais sejam novamente apreciados a partir de um dado contexto institucional.
    É de se ressaltar que, se de um lado, a Constituição Federal atribui a este Supremo Tribunal Federal a tarefa da guarda da integridade da ordem jurídico-constitucional, de outro, é assente que o seu texto está sujeito a uma sociedade aberta de intérpretes (HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997), os quais podem, de acordo com as alterações histórico-culturais, exercer alternativas plurais de interpretação.

    Tenho sustentado na obra Direitos Fundamentais e controle de constitucionalidade que:
    “Embora as modernas Constituições dos países que adotam a jurisdição constitucional consagrem a democracia e o princípio da soberania popular como princípios básicos, dispõem elas em geral sobre a forma de manifestação da vontade popular e sobre a atuação dos órgãos representativos dessa vontade. Estes devem agir dentro de limites prescritos, estando os seus atos vinculados a determinados procedimentos.
    Essas Constituições pretendem, portanto, que os atos praticados por esses órgãos de representação possam ser objeto de crítica e controle.
    Tal como observado por Grimm, um sistema que admite o conflito de opinião e a pluralidade de interesses como legítimo somente poderá subsistir se houver consenso sobre a forma de resolução de conflitos e sobre os próprios limites desses conflitos. Se a controvérsia tiver por objeto o próprio método de solução dos conflitos, então não está o sistema democrático livre da ameaça de instabilidades e de tumultos no seu funcionamento.
    Tal colocação tem a virtude de ressaltar que a jurisdição constitucional não se mostra incompatível com um sistema democrático que imponha limites aos ímpetos da maioria e discipline o exercício da vontade majoritária. Ao revés, esse órgão de controle cumpre uma função importante no sentido de reforçar as condições normativas da democracia e atenuar a possibilidade de conflitos básicos que afetem o próprio sistema.
    É interessante notar que as colocações de Grimm coincidem, fundamentalmente, com a opinião de Dworkin sobre o sentido do controle de constitucionalidade naquilo que ele denomina de ‘É interessante notar que as colocações de Grimm coincidem, fundamentalmente, com a opinião de Dworkin sobre o sentido do controle de constitucionalidade naquilo que ele denomina de ‘constitutional democracy’ em contraposição à democracia majoritária. É o que se pode ler na seguinte passagem:
    ‘Democracy means government subject to conditions – we might call these conditions – of equal status for all citizens. When majoritarian institutions provide and respect the democratic conditions, then the verdicts of these institutions should be accepted by everyone for that reason. But when they do not, or when their provision or respect is defective, there can be no objection, in the name of democracy, to other procedures that protect and respect them better. The democratic conditions plainly include, for example, a requirement that public offices must in principle be open to members of all races and groups on equal terms. If some law provided that only members of one race were eligible for public
    office, then there would be no moral cost – no matter for moral regret at all – if a court enjoyed the power to do so under a valid constitution struck down that law as unconstitutional. That would presumably be an occasion on which the majoritarian premise was flouted, but though this is a matter of regret according to the majoritarian conception of democracy, it is not according to the constitutional conception”.

    É fácil ver, pois, que, nos modelos não dotados de um sistema especial de controle de constitucionalidade, eventuais conflitos de índole constitucional resolvem-se pela interpretação da maioria, o que pode acabar por eliminar a possibilidade de qualquer consenso entre as forças políticas. Conflitos dentro do contexto constitucional convertem-se facilmente em confrontos que extrapolam esse âmbito.
    Nessas condições, tem-se de reconhecer que a simples existência de uma Corte Constitucional permite o tratamento relativamente imparcial e ordenado da constitucionalidade dos projetos políticos.

    Em verdade, a existência dessa instância tem, muitas vezes, uma eficácia prévia
    ou inibidora, evitando decisões que afetem o consenso constitucional. Mesmo em caso de impossibilidade de configuração imediata desse consenso, a pronta atuação da Corte Constitucional logra limitar e reduzir o âmbito do conflito, afastando a insegurança existente, decidindo o conflito e emprestando novo fundamento à controvérsia.” ( Mendes,Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. Estudos de Direito Constitucional. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.463-471.)
    (…)
    [E continuo]
    “É por isso que Häberle defende a necessidade de que os instrumentos de informação dos juízes constitucionais sejam ampliados, especialmente no que se refere às audiências públicas e às ‘intervenções de eventuais interessados’, assegurando-se novas formas de participação das potências públicas pluralistas enquanto intérpretes em sentido amplo da Constituição.

    É certo, por outro lado, que o Tribunal que exerce as funções de Corte Constitucional não pode deixar de exercer a sua competência, especialmente no que se refere à defesa dos direitos fundamentais em face de uma decisão legislativa, sob a alegação de que não dispõe dos mecanismos probatórios adequados para examinar a matéria.
    Em verdade, (…), a competência do Tribunal para examinar os fatos e prognoses legislativos advém da própria competência que lhe é constitucionalmente reconhecida para proceder à aferição de leis ou atos normativos em face do parâmetro constitucional.
    Uma vinculação estrita do órgão judicial aos fatos e prognoses legislativos fixados pelo legislador acabaria, em muitos casos, por nulificar o significado do controle de constitucionalidade.
    Não é preciso ressaltar também que a negativa do Tribunal de examinar, com todos os
    elementos disponíveis, a correção dos fatos e prognoses estabelecidos pelo legislador pode corresponder a uma vinculação, ainda que não estritamente consciente, aos fatos legislativos pressupostos ou fixados pelo legislador.
    Em outras palavras, tal postura poderá significar, em verdade, uma renúncia à possibilidade de controle de legitimidade da lei propriamente dita. Ou, o que se revela igualmente inadequado e grave, a não adoção de processos racionais de apreciação dos fatos e prognoses legislativos poder em outras palavras, tal postura poderá significar, em verdade, uma renúncia à possibilidade de controle de legitimidade da lei propriamente dita. Ou, o que se revela igualmente inadequado e grave, a não adoção de processos racionais de apreciação dos fatos e prognoses legislativos poderá ensejar decisões lastreadas apenas em bases intuitivas.

    Por outro lado, não há dúvida de que a complexidade das relações envolvidas nas questões constitucionais exige que o órgão que exerce as funções de controle disponha de mecanismos procedimentais que lhe permitam uma atuação consciente e, tanto quanto possível, integradora no sistema constitucional.
    Em verdade, a substituição de uma decisão intuitiva do legislador por uma decisão igualmente intuitiva da Corte coloca em xeque a própria legitimação do sistema de controle de constitucionalidade.
    Se já se tem dificuldade de aceitar uma decisão tipicamente voluntarista ou intuitiva do órgão de representação popular, certamente não se pode sequer cogitar de uma eventual substituição de um voluntarismo do legislador pelo voluntarismo do juiz.
    É por isso que se afigura essencial o desenvolvimento de técnicas que possibilitem decisões racionalmente fundadas por parte do órgão judicial de controle.” (Mendes,Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. Estudos de Direito Constitucional. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.480-482.)
    Esta Corte, portanto, jamais pode olvidar que a tarefa de interpretar a constituição não pode prescindir da abertura procedimental. Essa constatação, ao meu entender, é crucial para que o papel institucional do Supremo Tribunal Federal esteja aberto não somente às mudanças legislativas, mas sobretudo, ao modo pelo qual essa legislação federal deve ser interpretada à luz de inovações ou alterações sociais, históricas e culturais.
    Não é possível exigir a vinculação do legislador federal às decisões do STF, em sede de controle abstrato de normas (não sendo despiciendo lembrar que o Poder Legislativo Federal não consta do parágrafo único do art. 28 da Lei nº 9.868/99), simplesmente porque eles contrariam a “última palavra” dada pela Corte. O que pretendo ressaltar é que o fato de o legislador resolver criar ou regular matéria já submetida ao crivo do Supremo Tribunal Federal apenas indica que, no jogo democrático, o “diálogo” e o debate institucional ainda devem continuar.
    Ademais, leitura atenta da parte dispositiva dos precedentes invocados na presente reclamação (ADIs 1351 e 1354) demonstra que esta Corte, para evitar o vazio legislativo decorrente da declaração de inconstitucionalidade, procedeu à interpretação conforme do caput dos arts. 56 e 57 da Lei nº 9.096/95, eliminando de tais dispositivos as limitações temporais neles constantes, “até que sobrevenha disposição legislativa a respeito”. Ou seja, a própria Corte entendeu pela necessidade de atuação legislativa nesse caso.

    Diante do exposto, nego seguimento ao pedido, com fundamento no art. 21, §1º, do RI/STF, ficando prejudicado o pedido de liminar.

    Publique-se.
    Arquive-se.

    Brasília, 15 de abril de 2007.

    Ministro GILMAR MENDES
    Relator

  3. Em 05/10/1988, foi promulgada a Constituição do Brasil pela Assembleia Nacional Constituinte, que reza:

    “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”

    Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

    Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

    Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

    At. 5º.

    II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei;

    § 1º As normas garantidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

    § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

    Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:

    I – caráter nacional;

    II – proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes;

    III – prestação de contas à Justiça Eleitoral;

    IV – funcionamento parlamentar de acordo com a lei.

    § 1° – É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.

    § 2° – Os partidos políticos, após adquirirem personalidade jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral.

    § 3° – Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei.

    Art. 49. É de competência exclusiva do Congresso Nacional:

    XI – zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;

    Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

    X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

    Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por suas opiniões palavras e votos.

    Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:

    I – emendas à Constituição;

    II – leis complementares;

    III – leis ordinárias; .

    Art. 60. A Constituição poderá ser emendada, mediante proposta:

    I- de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;

    II – do Presidente da República;

    § 2º A proposta será discutida e votada em cada casa do Congresso Nacional em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

    § 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.

    § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

    I – a forma federativa de Estado;
    II – o voto direto, secreto, universal e periódico;

    III – a separação dos Poderes:

    IV -os direitos e garantias individuais.

    Art. 61. A inciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro do congresso ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Sendo Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

    Art. 65. O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o rejeitar.

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