Obras iniciadas no último governo acabam paradas e reduzem a capacidade do DF em Saúde, Educação e Assistência Social

Michael Melo/MetrópolesAs políticas públicas que deveriam ser de Estado são abandonadas com a troca de mandato.

Entra governo, sai governo e uma série de promessas vira coisa do passado e até mesmo sucata. Em Brasília não é diferente. Na capital do país, escuta-se que devem ser feitas políticas de Estado, para durarem e trazerem benefícios à população independentemente de quem comanda o Palácio do Buriti. No entanto, cada governante eleito quer deixar uma marca própria. O problema é que o dinheiro público investido nas obras idealizadas por antecessores não volta.

Em alguns casos, ele se perde em meio à chuva, na ação de vândalos ou pelo fato de materiais tecnológicos se tornarem obsoletos. Em meio a essa luta de egos, além da verba gasta, estão as empresas que começam a trabalhar depois de passar por licitações demoradas e não veem o dinheiro entrar na conta. Em visita a Ceilândia Norte, por exemplo, a reportagem do Metrópoles encontrou pelo menos três obras iniciadas na gestão de Agnelo Queiroz (PT) que estão paradas.

A segunda Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da região, prevista para atender 450 pessoas por dia, começou a ser construída, mas teve as obras paralisadas em 2014, por ação do Tribunal de Contas do DF (TCDFT). Ali foram investidos R$ 2,3 milhões do Ministério da Saúde. A fundação acumula água da chuva nas bases, a estrutura metálica está enferrujada e o pré-moldado figura em meio ao mato alto.

Michael Melo/Metrópoles

Poucos metros depois, está um albergue previsto para receber moradores de rua e desafogar o abrigo instalado em Águas Claras. No entanto, o local, na QNR 2, está abandonado. Tem somente um vigia, cachorros, fezes no chão e uma licitação de R$ 800 mil se deteriorando com a ação do tempo.

No entanto, o GDF afirma que o albergue, com obra iniciada no governo anterior, já foi entregue “com toda a parte que concerne à Novacap, concluída. Aguarda agora a ocupação do espaço, que ficará a cargo da Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos.”, diz nota do GDF.

Obra mais cara
A situação se repete em outras obras. Paradas ou andando a passos lentos, elas deterioram-se a cada dia. Para o engenheiro civil e patologista de edificações Dikran Berberian, a paralisação é sempre muito ruim. “Em algum momento, o governo percebeu que havia uma licitação superfaturada ou paralisou a obra por qualquer outro motivo. Tecnicamente, há um desgaste, as pessoas roubam as peças, a obra envelhece, vai acabar saindo muito mais cara do que o previsto inicialmente”, afirma.

Segundo Berberian, as obras paradas, se tiverem uma licitação limpa, podem até dobrar de preço. “É o meu dinheiro e o seu. Isso que me aborrece. São ainda obras sociais: UPAs, creches, albergues, que beneficiariam a população diretamente”, lamenta o especialista.

Unidades de Pronto Atendimento (UPAs)
A primeira Unidade de Pronto Atendimento inaugurada no Distrito Federal foi a de Samambaia, em 2011. Ela custou R$ 2,6 milhões e teve manutenção prevista de R$ 250 mil por mês. A intenção inicial era de que 12 unidades do tipo ajudassem a desafogar o atendimento nos pronto-socorros da capital brasileira. No entanto, somente seis UPAs ficaram prontas.

Pelo menos outras três começaram a ser construídas, mas as obras pararam em 2014. Entre elas, a 2ª UPA de Ceilândia que ajudaria no atendimento da população de Águas Lindas (GO). É uma característica de Brasília receber moradores do município goiano e a unidade reduziria as filas nos hospitais.

Por ter tal característica, essa seria uma UPA Porte 3, com 13 a 20 leitos de observação e atendimento previsto para 450 pacientes por dia. Localizada na QNR 1, de Ceilândia Norte, a área reservada para a unidade tem um tapume com todos os materiais usados para o início da obra. Só em terraplenagem, compra dos pré-moldados, fundação, estrutura, serviços prestados foram gastos R$ 2,3 milhões.

Michael Melo/Metrópoles

Para concluir toda a UPA, contando com fiação, estacionamento e calçada, a obra custaria R$ 4,9 milhões aos cofres públicos. Toda a verba vem do Ministério da Saúde. Na verdade, o dinheiro já foi liberado. Mas, a unidade – com 44% das obras concluídas – não tem prosseguimento devido a um processo do Tribunal de Contas do DF.

Em Ceilândia, a estrutura metálica está comprometida, os pré-moldados se misturam à grama alta. As estruturas para abrigar os funcionários foram queimadas. No local, somente um empregado da construtora e dois cachorros fazem a segurança do que foi investido com dinheiro público. O mesmo acontece no Gama. Lá a construção parou em dezembro de 2014, com cerca de 40% de execução. Não há previsão de retorno. Enquanto isso, o dinheiro do Ministério da Saúde fica parado na conta do GDF e a verba já investida se perde com a ação do tempo e o descaso.

Aterro Sanitário Oeste de Samambaia
Previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos para ficar pronto em 2 de agosto de 2014, o Aterro Sanitário Oeste, em Samambaia, ainda é um canteiro de obras. O projeto é essencial para a desativação do Lixão da Estrutural, que mantém cerca de 2,5 mil catadores em uma rotina pesada e insalubre de trabalho. Em 2014, seis pessoas morreram no local. Elas foram atropeladas ou soterradas no lixão.

O GDF retomou as obras em julho deste ano e afirma que 60% da construção está concluída. A previsão é de que o aterro seja inaugurado em meados de 2016. Ele poderá receber 2,7 mil toneladas de lixo produzidos diariamente em Brasília.

Michael Melo/MetrópolesO problema é que para a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos seria necessário dar condições de os catadores saírem do lixão e começarem a trabalhar. Para tanto, o governo anterior previu a construção de quatro Centros de Triagem. Nesses lugares, os trabalhadores teriam dignidade. Fariam a seleção do lixo, teriam um lugar para tomar banho e a segurança de serem integrados a uma cooperativa.

No entanto, os contratos de R$ 2,5 milhões foram suspensos. O centro do P Sul estava com as obras avançadas; os outros três – das Asas Sul e Norte e do Gama – tinham concluído a terraplenagem. Vinculada aos centros, estaria a coleta seletiva. Mas esta prática também foi suspensa em parte do DF. No início de 2015, o Serviço de Limpeza Urbana (SLU) interrompeu a coleta em São Sebastião, Paranoá, Itapoã, Fercal e Planaltina, por alegar baixa adesão.

Centro Integrado de Gestão (CGI)

Reprodução/ Apresentação GDF 2013

O projeto surgiu como uma promessa de gestão moderna, integrada. O governo teria em um mesmo ambiente diferentes órgãos trabalhando juntos. Seria o exemplo de transparência em dados e de segurança para a população, com notificações em tempo real. Tudo funcionaria por meio da segunda Parceria Público-Privada (PPP) mais cara do DF. O valor estimado inicial era de R$ 837 milhões, mas a licitação fechou no valor médio de R$ 770 milhões, a serem pagos em 15 anos.

O consórcio que iniciou as obras pagou R$ 120 milhões pelos equipamentos instalados na primeira etapa, mas a Justiça suspendeu o contrato em 2015. O centro é a segunda parte do Sistema de Monitoramento e Gestão, que mantinha a vigilância em todo o DF com 128 câmeras e 820 projetos.

Era possível, por exemplo, o governador ver do tablet dele o que acontecia em hospitais, no Metrô, em creches e em algumas vias do DF. Mas tudo está parado. Questionado sobre a parceria e retorno do monitoramento iniciado em 2013, o Governo do Distrito Federal respondeu que “algumas cláusulas do contrato da CGI estão em análise jurídica para que tenham prosseguimento”.

Ciclovias
Prevista para ficar pronta até a Copa de 2014, realizada entre junho e julho daquele ano, a pista de caminhada do Parque da Cidade tem brita e uma camada fina de piche. Seriam 10 km de pista para os pedestres. Quando ela ficasse pronta, a antiga via seria exclusiva para os ciclistas. De acordo com a Secretaria de Infraestrutura e Serviços Públicos, 65% da pista está concluída.

Michael Melo/Metrópoles
Com 411 km, a malha cicloviária do DF tem trechos em construção. A secretaria afirma que está fazendo um “diagnóstico para manutenção e/ou construção das ciclovias em todo o DF”. A intenção é atingir, em quatro anos, 649 km em ciclovias e ciclofaixas.

Albergues e CRAS

Michael Melo/Metrópoles

Parte de uma política para abrigar moradores de rua e de um Sistema Único de Assistência Social, os quatro albergues com obras iniciadas no governo anterior estão parados. Na unidade de Ceilândia Norte, só quem mora lá é o vigia. A instalação tinha iluminação, mas a população furtou todas as lâmpadas. No chão, há fezes, brita e areia espalhados.

Durante a noite, os tiros amedrontam o vigia, que precisa contar com dois cachorros para que os bandidos não se aproximem. A previsão era ter abrigos em Planaltina, São Sebastião, Recanto das Emas e Ceilândia Norte. Cada um com custo médio de R$ 800 mil.

Michael Melo/Metrópoles

Ao lado do albergue de Ceilândia, está o Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), responsável pelos serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). O prédio está pronto, mas as manilhas estão espalhadas pelo jardim e o vidro da cabine do vigia acumula diversas marcas de tiros.

Não há ainda profissionais para o atendimento nem jovens em internação.

Creches
O maior gargalo da educação no DF reside na oferta de vagas para crianças de 0 a 5 anos. Desde 2011, são prometidos 112 Centros de Educação da Primeira Infância (CEPIs).Os recursos são divididos entre o governo federal e o local, mas as obras caminham a passos lentos. Atualmente, a Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do DF conta com 39 CEPIs. O governo de Rodrigo Rollemberg inaugurou 12.

Michael Melo/Metrópoles
A reportagem do Metrópoles foi até a Creche Jacarandá, localizado na 204/205 Sul, e constatou que a estrutura está praticamente pronta, mas não tem alunos nem professores. No lugar da horta, há mato. Nos corredores, somente materiais de construção, nenhuma criança correndo. As janelas de vidro são protegidas com madeirite, para que não sejam quebradas.

O Governo do Distrito Federal alegou que todos os centros com atividades iniciadas em 2015 estão funcionando. “Os profissionais são contratados pelos gestores das creches.” Afirmou ainda, por meio de nota, que a Secretaria de Educação do DF “fez gestão junto ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para a construção de mais 36 unidades escolares, ainda sem previsão”.

Fonte: metropoles.com

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui