Toma posse no STM ministro que foi piloto de Lula e Dilma

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Joseli põe ducha fria nos protestos de rua que pedem volta da ditadura: “Nas Forças Armadas não há nem clima e nenhuma vontade de acabar com a democracia”

Discreto, paciente, de fala tranquila e disciplinado. Essas são algumas das características do tenente brigadeiro que já foi piloto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente Dilma Rousseff. Joseli Parente Camelo, que toma posse hoje como ministro do Superior Tribunal Militar (STM), passa a atuar agora como julgador de crimes militares cometidos no país.

Com passagens pelos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula e o primeiro mandato de Dilma, Joseli afirma que a missão de cuidar da segurança e da vida dos chefes de poder, “é glamoroso”, mas também envolve muitas preocupações.

Em entrevista exclusiva ao Fato Online, o novo ministro falou sobre a experiência de pilotar para presidentes, o Estatuto do Desarmamento, as mudanças no Código Penal Militar, o uso das Forças Armadas em ações pacificadoras e avaliou como passageiro o momento atual da crise econômica e política do Brasil. Sobre as últimas manifestações populares em que alguns participantes pediam a volta dos militares no comando do país, o ministro foi enfático: “Nas Forças Armadas não há nem clima e nenhuma vontade de acabar com a democracia”.

No dia 9 de janeiro o brigadeiro deixou o cargo de secretário de Coordenação e Assessoramento Militar no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), após 12 anos na pasta. No dia 21 de janeiro, a presidente Dilma enviou ao Senado Federal a indicação do piloto ao cargo de ministro do STM. O nome de Joseli foi aprovado em sabatina no plenário do Senado no último mês. O novo ministro ocupará uma das três cadeiras destinadas a oficiais-generais da Aeronáutica na composição do tribunal. A vaga é decorrente da aposentadoria do ministro José Américo dos Santos.

Joseli tem 61 anos, é natural de Fortaleza (CE), ingressou na carreira militar em março de 1969. Foi promovido a brigadeiro-do-ar em março de 2004. Possui mais de cinco mil horas de voo e exerceu cargos importantes em 46 anos de carreira militar.

A entrevista:

Como foi a experiência de pilotar para os presidentes Lula e Dilma?

É uma honra, um privilégio e uma responsabilidade muito grande. A gente muitas vezes vê só o lado do glamour, mas é preciso ver mais pelo outro lado da responsabilidade. Eu era responsável por tudo que acontecesse. Aí foi que eu pensei no quanto era importante, na ansiedade de tudo ter que dar certo e nada poder dar errado. Você com o presidente, uma coisinha bem pequena se torna uma coisa grande. Mas é muito glamoroso e todo mundo se sente muito prestigiado. Nós fazíamos uma seleção muito grande para voar com o presidente. Não é só o problema da pilotagem. Tem o problema da conduta do piloto, o problema da discrição. Tudo isso nós avaliamos para colocar em um avião presidencial.

O senhor trabalhou também com o ex-presidente Fernando Henrique?

Eu voava com os ministros na época. Com o presidente (FHC) eu trabalhava no Conselho de Defesa Nacional, fui ajudar na implantação da Secretaria Geral do Conselho de Defesa Nacional. Paralelamente, como eu estava tratando da política de defesa, eu achava importante ter o conhecimento do pensamento do presidente e procurei dentro de algumas áreas temáticas, de interesse do governo, tirar do discurso do presidente os pensamentos sobre forças armadas, economia e sobre relações exteriores. O presidente um dia viu esse trabalho. O embaixador Sardenberg levou para ele e ele pediu para publicar. Nós publicamos três livros. Eu até disse a ele: “mas o senhor não vai ter tempo de ler para fazer a revisão”, ele respondeu: “não, mas eu confio em você”. Com isso nós publicamos três livros, onde tratávamos de alguns temas de interesse do governo, da sociedade e do Brasil como um todo.

Como o senhor avalia o atual momento vivido pelo governo?
Esse é um problema que junta o econômico e o político. É um problema que eu acredito que seja momentâneo. Eu tenho muita esperança que isso venha a ser resolvido. O problema da corrupção vem de longas datas. A justiça é muito importante nesse processo e (tudo) está sendo depurado. Vai passar tudo isso. Agora, é muito importante que haja esse ajustamento do Congresso com o Executivo. É muito importante que haja essa negociação. É um assunto que nós militares não entramos muito, mas eu tenho convicção que é uma crise passageira.
Nos últimos protestos, várias pessoas foram às ruas pedindo a volta dos militares ao poder. Qual o posicionamento do senhor sobre o assunto?

Olha, não é o meu posicionamento. Até hoje – eu estou saindo agora do alto comando da aeronáutica – eu vejo que nas Forças (Armadas) não há nem clima e nenhuma vontade de acabar com a democracia. Nada melhor que a democracia. Nós militares sabemos disso. Você estar em um regime autoritário aonde você não sabe o dia seguinte, você não tem uma liberdade de expressão, isso nós não toleramos mais. Não há mais espaço para isso. A pior das democracias é melhor do que o melhor dos regimes autoritários.

“Nada melhor que a democracia. Nós militares sabemos disso. Você estar em um regime autoritário aonde você não sabe o dia seguinte, você não tem liberdade de expressão, isso nós não toleramos mais”.

Joseli Parente Camelo, ministro do STM

O que o senhor pensa sobre o uso de armas por civis no momento em que o estatuto do desarmamento voltou a ser discutido?

Eu sou favorável ao desarmamento, eu nunca levei uma arma para casa e sempre tive porte de arma. Eu nunca tive uma arma particular. Então, a minha posição pessoal é essa: não tem que ter armamento.

Como o senhor vê a participação das Forças Armadas na segurança interna? 

Eu vejo que dentro do Brasil, pelo sucesso quando atuam em qualquer operação, as Forças Armadas são muito aplaudidas pelos brasileiros. Mas eu acredito que a função constitucional da segurança interna é das polícias militares. Então eu acho que nós temos que ter mais investimentos nas polícias, nos órgãos de segurança e a nossa participação tem que ser excepcional, em momentos críticos, não pode ser banalizada.

Em que situação as Forças Armadas poderiam ser acionadas?

Naturalmente que nós temos a lei complementar de 1999, que regulamenta tudo isso e dá poder à presidenta de acionar qualquer um dos poderes e autorizar o uso das Forças Armadas. Acho que nós estamos preparados para isso. Tem até uma matéria constitucional, segundo a qual esse emprego tem que ser feito de forma muito excepcional. Nós temos é que investir nos órgãos de segurança pública, que são os órgãos que institucionalmente são designados para isso.

O que o senhor acha que deve mudar no Código Penal Militar?

O Código Penal Militar e o Código de Processo Militar são de 1969, portanto, são anteriores a nossa Constituição. Nós temos que modernizar (os dois códigos) e o trabalho já está sendo feito (pelo Congresso Nacional). Nós temos uma comissão no Superior Tribunal Militar que está trabalhando com isso e já estão tratando com o Congresso e com o Conselho Nacional de Justiça. Nós temos crimes que não existiam naquela época – por exemplo, os crimes com relação a ecologia. Os crimes cibernéticos também não existiam. Então nós temos que modernizar o nosso código. Muita coisa está sendo estudada. Eu não posso dar detalhes porque eu não tenho conhecimento do que está lá, mas nós sabemos que estamos ultrapassados e temos a necessidade urgente de mudança.

Sobre a discussão da mudança do código militar na questão de gênero. Qual o posicionamento do senhor?

Eu acho que a discriminação e o preconceito não existem só dentro dos quarteis, mas nós não podemos tolerar. O que o Código Penal Militar não tolera é a manifestação sexual dentro do quartel. Nós militares não temos nenhum problema. A nossa preocupação é que ele (o militar) tenha ética, que ele cumpra todas as normas. Se ele cumprir todas as normas de conduta dentro do quartel, ele vai ser respeitado por seus pares e superiores hierárquicos.

O ex-conselheiro do CNJ Bruno Dantas defendeu a extinção da Justiça Militar. O que o senhor pensa disso?

Nós temos na Justiça Militar 800 pessoas. O gasto da Justiça Militar no Brasil todo, não só no Superior Tribunal, é de 0, 01% do Orçamento. Para a importância que tem a Justiça Militar, eu acho isso muito irrelevante para o país. Eu estive com o ministro (Ricardo) Lewandowscki (do STF) e esse foi um assunto que nós conversamos. O ministro é plenamente favorável à existência da Justiça Militar. Ele disse mais: que foi feito essa comissão e não houve representante do Superior Tribunal Militar. Então ele pediu que essa conclusão, a que a comissão chegou, fosse mandada para o STM para nós analisarmos e darmos nossa opinião nesse assunto. Ele falou ainda que podemos até criar uma nova comissão dentro do Conselho Nacional de Justiça para analisarmos a ampliação da competência da Justiça Militar.

O Senhor ficou 40 anos em atividades militares onde a disciplina, hierarquia e o regimento da Aeronáutica sempre estiveram latentes.  O que o Senhor espera nessa transição?

A minha expectativa é que eu possa conduzir com justiça. Naturalmente eu tenho muito a aprender. É um novo desafio. Nós estamos ao longo da carreira tratando desses assuntos de demora, de sindicância, de inquéritos penais militares. Agora estaremos tratando da última instância da justiça militar. Eu sei da minha responsabilidade que é muito grande e sei que, inicialmente, eu terei muito a aprender.

Fonte: fatoonline.com.br

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