A frase é de Disraeli (Benjamin Disraeli, Earl of Beaconsfield- 1804/1881), líder do partido Conservador da Inglaterra, durante a segunda metade do século XIX, criador do chamado “Tory Socialism” – o apoio do partido conservador às reivindicações da classe operária como direito de sufrágio, leis sociais – e o mais influente primeiro ministro da Inglaterra, no período do reinado da Rainha Vitória.
Disraeli é um membro ilustre, situado mais no campo da ação do que da teoria, da tradição conservadora da política, que se opunha ao mesmo tempo e com igual rejeição, à revolução social e ao reacionarismo.
Nesta tradição de pensamento político se enquadram, Burke, Disraeli, Tacqueville, Metternich, Coleridge, Carlyle, Cardeal Newman, Taine, Jefferson, Madison, Franklyn, Jonh Adams, J. Burckhardt, Churchill, De Gaulle e outros muitos, ilustres pelo pensamento ou pela ação.
O nascimento desta concepção política, opondo-se por igual às tendências revolucionárias e às reacionárias, ocorre com Edmund Burke, na sua clássica interpretação da Revolução Francesa (“Reflexões sobre a revolução na França”) em 1790.
Durante o século XIX, com a consolidação da Revolução Francesa e sua dimensão imperial com Napoleão, com a revolução industrial, a questão operária, e o surgimento do socialismo em 1848 com o Manifesto Comunista, ergue-se, na esteira dos movimentos contra-revolucionários, a vertente reacionária do pensamento político, que defende o “retorno ao passado”, à monarquia absoluta, à submissão ao Papa, ao restabelecimento dos privilégios aristocráticos, e à repressão dos movimentos populares.
Os principais nomes associados com esta concepção são De Maistre, De Bonald, Veuillot, Donoso Cortés, Pio XI, Barres e Maurras.
O pensamento conservador ocupou o espaço entre a visão revolucionária (Francesa e depois socialista) e a visão reacionária que defendia o retorno ao passado medieval e católico da Europa, legitimando as ações políticas contra-revolucionárias.
Como se pode perceber, pela mera listagem dos nomes, a corrente conservadora se enraíza basicamente na cultura Anglo- americana, enquanto que a reacionária na cultura Francesa. Para Disraeli, como para Burke antes dele e Churchill depois, o estado normal de uma sociedade é a mudança, mas a mudança adaptativa, gradativa, jamais a revolucionária.
Mudar a sociedade e seu governo de cima para baixo, num só momento, e de forma radical, é tão absurdo para os conservadores quanto, ignorar as mudanças que ocorrem e querer fazer o relógio da história andar para trás, como queriam os reacionários. Por isso, a frase de Disraeli é emblemática. Ao grande líder não basta conhecer-se a si mesmo (o que é fundamental), mas por igual ele deve conhecer o seu tempo. Para Disraeli, como para os conservadores, o valor mais valioso da política é a liberdade. Para eles, somente o despotismo pode produzir a igualdade, já que a própria natureza determinou que os seres humanos são desiguais. A tentativa de impor a igualdade à força, acaba por liquidar com a liberdade.
Conhecer o seu tempo é para Disraeli a marca do grande líder porque o capacita a entender o rumo dos acontecimentos, o fluir do processo histórico. De posse deste conhecimento ele não pode e não deve, porque nunca vai conseguir, opor-se a este movimento.
Deve, ao contrário, associar-se a ele, e agir sobre ele de forma a evitar que escape de seu leito natural : a mudança evolucionária (não revolucionária), gradativa (não súbita e imediata), agregativa (que preserve tudo o que vem funcionando bem do passado/ substitua o que deixou de funcionar), pacífica e, acima de tudo, que amplie a faixa de liberdade ao invés de restringi-la.
A lição de Disraeli é intemporal. Conhecer-se a si mesmo é a máxima de Sócrates que nos vem da Grécia clássica, e conhecer o seu tempo é a marca do realismo político, da lucidez e da sensibilidade de um líder.
Foi conhecendo seu tempo que Disraeli cedeu às reivindicações dos operários, e, contrariando os interesses da burguesia inglesa, fez aprovar as leis de proteção ao trabalhador (redução de jornada, trabalho infantil, condições de higiene no trabalho) e as leis que abriram o direito ao sufrágio a sucessivas camadas do operariado.
Com Disraeli as concessões eram oportunas, e feitas no momento certo do ponto de vista político da classe dominante:
“quando quem reivindica não possui ainda força suficiente para exigir, e quando quem concede, não possui mais condições de evitar”
O resultado do predomínio da política conservadora, no período mais intenso de conflito social na Inglaterra, e das concessões feitas seguindo a regra de prudência acima enunciada, foi que a Inglaterra passou, de uma sociedade tradicional para uma sociedade industrial, sem revolução, sem guilhotina, sem guerra civil, preservando suas instituições políticas, e até mesmo dando-se ao luxo de ostentar seus nobres e sua rainha, até os dias de hoje (ainda que, mantendo seu status, cerimonial e tradições ao preço da perda total do poder político).
Fonte: Política para Políticos