Agnelo Queiroz começou o terceiro ano à frente da administração do governo do Distrito Federal com duas novidades na área de transporte públicos. Novidades que, diga-se de passagem, poderiam ter sido implementadas na segunda semana de governo. Há dois anos, portanto.
A primeira é a re-introdução no sistema de transporte coletivo de ônibus executivos, apelidados na década de 1970, quando começaram a ser utilizados nas grandes cidades brasileiras de “frescões”, pois eram dotados de ar condicionado a bordo. Não dá para identificar a razão pela qual no governo Agnelo as coisas são feitas tardiamente e de forma incompleta. Por que estas novas linhas, operadas pela TCB, já não estão operando há meses e por que elas não nasceram interligadas ao metrô e ao ônibus executivo que liga o Aeroporto ao centro da cidade? Dizem que isso vai ser feito mais tarde, num futuro que não se sabe bem quando.
A segunda é implantação de 476 abrigos – número cabalístico – nas paradas de ônibus do Distrito Federal. Em termos estéticos, os novos abrigos de ônibus estão longe dos que foram projetados por Nicholas Grimshaw, feitos originalmente em alumínio e vidro blindex, dotados de iluminação interna e painéis publicitários. Em governos anteriores, só as áreas nobres, como o Plano Piloto tiveram direito a estes modelos mais sofisticados. Também em nada se assemelham aos abrigos tradicionais – e tombados junto com o Plano Piloto – com acabamento em pastilhas de cerâmica instalados na vias W. 3 e L.2 e também nos Eixinhos.
Para o povão que pega ônibus, uns quatro por dia, coube uma estrutura em concreto pré-moldado, sem iluminação interna, sem bancos anatômicos – como nos abrigos em metal do Plano Piloto – e o pior de tudo: segundo os usuários, o formato dos novos abrigos impede a visualização dos ônibus que estão a chegar. A lateral esquerda deles impede a visibilidade da rua e até da circulação das pessoas. Afinal, em tempos de seqüestro relâmpago, é sempre bom ver de longe quem está chegando.
Detalhe: apesar da simplicidade estrutural e da ausência de acabamento, o valor médio de cada abrigo desses é de R$ 13.447,00. Na verdade, existem quatro modelos, cujos preços variam de R$ 12.844,48 a R$ 14.085,11. Os mais caros serão dotados de um espaço para abrigar uma mini biblioteca e adaptações para conferir acessibilidade a cadeirantes. No meu entender, todos os pontos de ônibus do Distrito Federal deveriam ser acessíveis aos portadores de necessidades especiais.
Em alguns locais, onde houver uma concentração maior de passageiros, poderão ser colocados dois módulos justo-postos, duplicando o preço para perto de R$ 27 mil ou mais por parada. Neste programa, que vai instalar 476 casinholas em pontos de ônibus, o GDF, via o DFTrans vai gastar R$ 6,2 milhões, até o fim do ano.
De tamanho superior e contando com melhor acabamento, maior volume de equipamentos e conforto, custo das casas populares equivale ao de duas ou três paradas de ônibus do GDF.
Minha Casa, Minha Vida
O valor unitário já salta aos olhos, devido à simplicidade dos abrigos, sem qualquer item ou equipamento que pudesse acrescentar algum diferencial de conforto aos usuários de ônibus ou que justificasse custo tão elevado. Não há iluminação interna. Espaço para fixação de informes de rotas e horários dos ônibus não foi previsto. Grosso modo, poder-se-ia dizer que o abrigo é feito pela montagem de sete peças de concreto: duas laterais, o teto e três travessas horizontais que formam a parede dos fundos. O banco, que deve abrigar umas seis pessoas, é um pranchão também em concreto.
Causa estranheza ainda maior, quando se compara o valor destes abrigos com as casas do programa federal Minha Casa Minha Vida. Até o ano passado, o governo Dilma estava produzindo moradias a um custo mínimo de R$ 42 mil. Neste ano, já subiu para cerca de R$ 56 mil, mas R$ 9 mil deste total se destinam à aquisição do lote onde será erguida a casa popular.
As casas populares do governo federal devem possuir, pelo menos, 32 metros quadrados. Pintura externa acrílica, esquadrias nas janelas e cerâmica e azulejo na cozinha e banheiro.
Segundo a cartilha da Caixa Econômica Federal, estas moradias devem ser erguidas sobre fundação, possuir um mínimo de 32 metros quadrados de área útil e contar com, pelo menos, sala, cozinha, banheiro, corredor de circulação, dois dormitórios e área externa com tanque de lavar roupa. A casa deve contar com laje de concreto ou forro de madeira ou PVC, sendo que a cobertura do telhado terá que ser com telha cerâmica sobre estrutura de madeira ou metálica.
O piso interno tem que ser de cerâmica na cozinha e banheiro. Nas demais áreas pode ser apenas cimentado. As paredes têm que ser em alvenaria e revestidas. No caso da cozinha e do banheiro, o revestimento é obrigatoriamente em azulejo no box do banho com altura mínima de 1,50m. Sobre as pias e tanque pode ser aplicado o que os técnicos chamam de barrado impermeável. As outras paredes internas contam com reboco e devem ser pintadas com tinta tipo PVA. Pintura acrílica ou textura impermeável é exigida na parte externa.
As janelas devem contar com esquadrias de ferro, madeira ou em alumínio, portas internas em madeira e externas em metal. Os imóveis são entregues equipados com as instalações hidráulicas e elétricas necessárias – algumas podem contar até com sistema de aquecimento solar d’água. Do lado de fora, o morador terá uma calçada de meio metro de largura circundando toda a sua moradia.
Por tudo isso, o governo Dilma pagava até o ano passado cerca de R$ 42 mil e, a partir de 2013, deverá pagar próximo a R$ 46 mil, já descontado o valor do terreno. O preço pode ser até mais baixo. No município capixaba de Serra, a prefeitura local construiu 500 residências investindo R$ 14 milhões: ou seja, R$ 28 mil por unidade.
Três paradas de ônibus de Agnelo compram uma casa da Dilma
Os abrigos de ônibus de Agnelo não possuem iluminação, água, banheiro, quarto, pia ou chuveiro. Não tem cerâmica no chão, nem são revestidos em azulejos. Externamente, não são pintados com tinta acrílica ou textura, nem contam com forro ou esquadrias. Mesmo assim, cada casinhola de Agnelo – daquele modelo mais simples e mais barato, sem biblioteca e sem acessibilidade para cadeirantes -, custa, aproximadamente, um terço de cada casa de Dilma. Ou seja, com o dinheiro que se compra três paradas de ônibus dessas do DFTrans, se compraria uma casa da Dilma – se fosse em Serra – ES, bastaria a verba de dois abrigos -, onde pode morar uma família inteira com um mínimo de dignidade.
Dignidade, me parece, é a palavra chave nestes abrigos de ônibus. Por que o usuário de ônibus do Plano Piloto conta com parada confortável, banco anatômico, iluminação interna, protegida por vidro blindex, enfim com o tratamento que um cidadão deve ter e os moradores das demais cidades do DF devem ficar numa casinhola que não lhe permite nem ver se o ônibus está chegando ou não?
Por que uma estrutura tão simplória, fabricada em grande quantidade, custa, assim, tão caro? Não há uma disparidade grande entre as residências de Dilma e as casinholas de Agnelo?
Com a palavra o governador.
Fonte: Blog Brasília por Chico Sant’Anna